domingo, 27 de junho de 2010

Mil e uma identidades

Falta-me inspiração para falar dos nossos encontros às escondidas. Foram tantas identidades que me perdi e não consegui retornar ao meu verdadeiro eu; por conseguinte, a cada fuga e a cada alteridade a alegria, o contentamento, o gozo, o deleite que buscava eram intensos a ponto de nortear tudo que era verdade e/ou mentira. Disfarcei-me para não sofrer e para desacreditar no que eu era de fato: obscuro e sombrio.
À proporção que me enganava e me iludia sendo outra pessoa, sofria com teu afastamento. Não queria que me visse sendo um outro ser: imagético e criado virtualmente para fugir de mim mesmo. Fui outros e outras porque precisava sair de meu ser a fim de satisfazer-te. Por mais que cada invenção fosse satisfatória e até prazerosa, sofria intensamente com tua ausência.
Tive que me desencontrar e me perder para ter a tua presença por perto, mas questiono sempre se realmente não é utópico e que teus sentimentos existem.
O pior momento não foi dar lugar a outros seres, porém deixar de ser eu. Saí pelo mundo a fora sendo vários e esquecendo de mim mesmo. Nunca se preocupava comigo, pois naquele momento eu não tinha a mesma importância que tua pessoa. Confesso que desacreditei em mim e no potencial que havia por trás de minha essência. Não me bastava mais viver, já que o eu e o tu não se harmonizavam mais. O que aconteceu comigo? Onde me acharei novamente? Onde estou? Aonde ir ao meu encontro? Qual identidade se aproximará melhor de mim e de ti?
Cada vez que me afastava de mim, não tinha a tua presença por perto para me afagar e acariciar meu coração. Esfriei-me por completo quando resolvi ser o que não sou verdadeiramente. Tive que inventar mil e uma utilidades para esse novo eu, morrendo-me paulatinamente e deixando de me importar com tudo que estava ao meu redor, inclusive com meu eu, porque os outros eram mais dignos de serem substantivados e, para cada um, criavam-se predicativos semelhantes à imagem que fosse engendrada.
Não existia nem vivia mais. Outros se apoderaram de mim. Alterava tudo à minha volta, visto que a cada alternância excluía-me excessivamente. E agora? Como procurar-me-ei? Serei fiel a essa forma excêntrica e descartável? A cada mil faces te amei. Juntas elas te amaram como se fosse eu. Todavia me dissolvi e tudo se diluiu ao vazio, ao caos, ao nada.
Máscaras inventaram muitos eus, ao passo que a imaginação fértil crescia. A cada passo dado sabia que poderia me deparar contigo em alguma esquina ou quarteirão, pois via a tua imagem a galopar indo e vindo ao meu encontro. O pior momento foi não saber qual identidade me caberia melhor para estar junto de ti, uma vez que foram tantas alteridades que os outros se tornaram mais importante do que os eus.
Enfim, parecia-me em um divã sendo analisado e questionado por ti. Enquanto ditava regras de sobrevivência para alguma personalidade enraizada no meu coração, fingia-me ser o que não era. Não obstante, o melhor de tudo foi saber que se preocupava comigo e que se importava com cada gesto, atitudes e ações minhas. Em comunhão permanecia nosso elo. Só espero que estejamos num perfeito anelo: sem movimentos cíclicos e com o amor que prometera para a construção de nossa história.


2 comentários:

  1. A musa da Controvérsia28 de junho de 2010 às 17:10

    Não consigo te ver nesse texto. Por um lado está bom, mas por outro... Seria interessante nomear qdo não fosse um relato da sua vivência. Vc sabe que vc escreve muitíssimo bem qdo escreve a dor dos outros, e qdo vc nomeia, o leitor já sabe que vc vai falar de alguém. Dá mais gosto de ler.

    ResponderExcluir
  2. Eu sinto esse texto de forma muito profunda: ele resgata a tendência do ser humano de transformar a sua personalidade para agradar o ser amado, condensa e modifica seu modo de ser e agir no mundo, para se adaptar ás expectativas de outra pessoa. Isso é arriscado, pois, muitas vezes modificamos tantas vezes quem somos que perdemos nossa identidade.

    ResponderExcluir