O mundo não pára, portanto a vida também não. Com o tempo, grávida, amadureci para seguir e completar meu destino: cuidar de meus filhos com afinco e amor. Tive que incinerar o passado e, mesmo sofrendo com ele, romper com o pecado que me sondava e que tinha me arruinado completamente.
Em falar em pecado, atravessei os sete mares que não fora planejado nem navegado antes após o término de relacionamento amoroso. Vivi, em princípio, a ira: odiei a vida, as pessoas ao meu redor e o que de fato tinha acontecido comigo. Foi duro, mas a raiva sucumbia aos extremos a ponto de não querer enxergar nada que pairava em minha volta.
Tudo conspirava excessivamente contra mim. Meu cérebro desparafusou por completo após o nascimento de minha filha. Engordei horrores e confesso que sentia náuseas e nojo de mim, mas mesmo assim procurei não transparecer e manter a mulher calma, centralizada como sempre. No entanto, por dentro tudo se corroia, encontrava-me destruída e uma mulher desse jeito e desorientada não segue a rotação do fuso horário, conforme deveria.
A ira assombrava-me tanto que enlouqueci. Era um ódio descomunal que comecei a chorar em excesso e a me sentir sozinha. A solidão ardia em meu peito de uma forma trandimencional, visto que não conseguia me situar devidamente no espaço em que me localizava. Minhas mamas pareciam diferentes das últimas gestações. Acho que a dor que havia em meu coração precisava ser exorcizada para dar lugar a uma nova pessoa, ou seja, aquela que sou de fato e que sempre encarnei no meu dia-a-dia nem sempre perfeito.
As pessoas sabiam do ocorrido, mas tinham vergonha de comentar ou de se constranger. Umas me ignoravam por completo, pois achavam absurdo uma mulher separada com três filhos prosseguir a vida sozinha. Mas gotas de raiva vinham em minha mente e, partir delas, tive que traçar uma estratégia para sobreviver e valorizar o que ainda sobrara de mim.
O tempo ia passando e percebi que não era somente a ira que me rondava, já que sentia uma preguiça intensa, vinda por meio de um efeito depressivo e angustiante. Tudo parecia remoto e traiçoeiro. Tomei vários remédios com orientação médica para me curar e sair da depressão, entretanto quanto mais os tomava mais embriagada permanecia no estado de calamidade que encontrava. Não queria viver e a preguiça naquele momento era quem servia de companheira inseparável. Confesso que fiquei dias sem arrumar a cozinha, deixando minha mãe fazer as atividades domésticas. Foi medonho pensar daquele jeito, porém era o que imaginava de verdade.
Para ser pratica, e para continuar dormindo demais, suguei, com uma bombinha, meu leite materno e o pus em cinco mamadeiras. Eu já sabia os horários que iria acordar e levantar para amamentar. Por isso parecia acordada somente naquele momento. Pois o único prazer que tinha na vida, por mais que se pense ao contrário, era ainda amamentar.
Engordei o dobro do peso que tinha. Parecia que o fantasma da gula tinha se apoderado de meu corpo e de minha boca. Celulites e estrias nasciam em mim de forma inexorável. Quando as via, chorava depressivamente.
Meses se passaram na casa de meus pais, lá era meu refúgio após ter dado a luz a uma linda menina. Voltei à minha casa. Parecia de pernas para o ar. Não sabia por onde começar, todavia, com ajuda de meus pais, consegui arrumá-la antes de retornar definitivamente. E logo digo que recomeçar é mais difícil do que começar.
Dias se passaram e algumas amigas vinham me visitar como de costume. Elas falavam dos maridos delas das relações amorosas impiedosamente. Confesso que sentia inveja da vida a dois que elas tinham naquele momento. Mas ouvia com educação toda história contada por elas. Elas sabiam que meu marido tinha me traído com outro homem e que os tinha pegado em minha cama de casal no domingo de páscoa. Senti-me fracassada e humilhada diante delas, contudo eu precisava prosseguir.
A luz surgiu em minha mente como outrora: entrei numa academia e comecei a malhar, comecei a conversar com meus amigos on line no MSN e coloquei as crianças numa creche e ainda tinha ajuda de meus pais com criança mais nova.
Um dia, sozinha em minha casa o telefone residencial tocou. Uma voz bonita e suave começou a perguntar se era a casa de Laura e eu disse que não era. Mas aquela voz não parou, pois percebera que não me encontrara animada e perguntou se eu desejava conversar e na mesma hora disse que não conversava com estranhos e que não tenho o hábito de expor a minha vida para quem não conheço. Ele me perguntou meu nome e disse que me chamava Ana. Até que me cansei da conversa e desliguei educadamente.
Pensei que não falaria mais com aquela voz, mas me enganei visto que no outro dia ele ligara no mesmo horário para conversar comigo. Achei aquilo muito estranho, mas resolvi dar uma chance ao Miguel – assim que ele se chamava – e conversamos por quase quarenta minutos.
Assim, todos os dias ele me ligava sempre no mesmo horário e quando acontecia de não ligar percebi que sentia a falta daquela voz misteriosa que tinha como objetivo me fazer bem, segundo ele.
Ele não morava na mesma cidade que eu. Um certo dia me convidara para ir a casa dele para nos conhecermos. De súbito disse não, pois tinha medo dele. Há muitos lobos em peles de cordeiro e não desejava passar por uma situação constrangedora.
Confesso que o imaginava um galã do tipo da novela das nove horas e passei a sonhar com ele em todo momento. Comecei a desejá-lo exorbitantemente e a me prender em prazeres individuais pensando em meu galã de novela. Creio que a luxúria invadira meu coração, meus desejos afloraram e me vi a gozar de tanto prazer que minha imaginação fértil me proporcionava. Nos meus sonhos eu me tratava de uma verdadeira vadia em busca de êxtase descomunal e assim viajava em busca de ocasiões sublimes e cheio de bel-prazer.
No dia seguinte pratiquei os mesmo atos litúrgicos após descobrir excelentes apetrechos numa loja que vendia produtos eróticos. Deliciei-me com cada ato impuro que me levava ao céu. Mas descobri que desejava mais que estar sozinha, e, certo dia, aceitei o convite do Miguel e fui ao Rio de Janeiro encontrá-lo. Marcamos na Rodoviária Novo Rio. Fui a viagem imaginado que ele era um galã de novela e fui delirando em meus pensamentos remotos.
Ao chegar à rodoviária, deparei-me com três homens: um magrelo, que tinha uma aliança no dedo, um gordinho com cabelos grisalhos e um bonitão sarado. Logo pensei “Tomara que não seja o gordinho porque ele é o mais feio de todos”. As horas passavam e nada do tal Miguel aparecer. Quando dei por mim somente sobrara o gordinho e ele veio me perguntar se eu era a Ana do telefone. No inicio gaguejei e fiquei espantada e pensei “Não vou dormir com este cara nunca”. Mas ele tinha uma ótima lábia, uma conversa suave e calma que me contagiou e fui passar o final de semana na casa dele. Chegou lá, ele me deixou à vontade e conversamos muito, mas ele foi tão sensível que, de repente, estava na cama com ele transando e fazendo borbulhas de amor. Nem sei como isso aconteceu, mas confesso que foram bons momentos.